Leticia Dáquer

Extra: Museu Nacional #01

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O maior acervo da América Latina pega fogo. Enquanto um prefeito cretino fala imbecilidades condizentes com a outra metade da sua vida dupla e um presidente safado finge que lamenta muito, a gente que é mais normalzinho chora pela perda irreparável desse museu. Mas por que mesmo o Museu Nacional era importante? Falamos com Nathalie Vlcek, especialista em línguas indígenas, e Adriana Ornellas, bibliotecária.

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pequenos machismos, grandes vitórias

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Vamos falar hoje de pequenos machismos terrivelmente entranhados na nossa sociedade, que muitas vezes passam batido e a gente nem nota.

Há algumas semanas um dos meus amigos médicos publicou esse meme no grupo de WhatsApp da faculdade:

Deixei quieto um tempo pra ver se alguém dizia alguma coisa. Alguns riram; a maioria nem respondeu. Depois de um tempinho fui no grupo das meninas mais chegadas e perguntei: quantos homens vocês conhecem que gastam mais que as suas mulheres? Só uma respondeu que isso era maluquice, pois sabe-se que mulheres gastam mais. As outras concordaram que seus maridos gastam mais – e eu me incluo nesse grupo. Não só porque ganho muito menos do que o meu marido, mas porque não tenho paixão por compras idiotas que nem ele (fora alguns muitos Funko Pops, não costumo comprar coisas inúteis e caras).

Como eu vi que ninguém notou o quão machista e idiota é esse meme, deixei o assunto morrer, apesar da vontade ter sido de apontar por que ele é machista. Esse tipo de piada cretina parte do pressuposto que mulheres são fúteis e interesseiras, gastando o dinheiro do marido, o pobre coitado que rala e bota comida na mesa, obrigado a dar dinheiro pra cobrir despesas como manicure, depilação, coleções infinitas de sapatos e bolsas e outros custos tipicamente femininos.

O que eu queria ter dito era isso:

1) Se é verdade que muitas mulheres são sustentadas pelos maridos, também é verdade que:

a) Em muitíssimos casos isso se dá por falta de incentivo a subir na carreira tanto quanto os homens;

b) Em muitíssimos casos isso se dá porque o ambiente no trabalho é tão machista que impede que mulheres avancem na carreira;

c) Frequentemente mulheres abandonam suas carreiras pra ficar com os filhos, pois todo mundo sabe que cuidar de filho é coisa só de mulher;

d) Frequentemente mulheres abandonam suas carreiras pra seguir o marido, que se muda por causa do emprego. Eu conheço uma dentista que parou de trabalhar porque o marido se muda periodicamente a trabalho e pra ela é impossível montar um consultório e formar clientela fixa sabendo que dali a dois anos vai se mudar novamente;

d) MULHERES GANHAM MENOS QUE HOMENS COM CAPACIDADES SEMELHANTES;

e) O mundo espera que as mulheres sejam sustentadas por seus maridos e muitas delas jamais se questionam sobre isso, jamais pensam em ter sua independência financeira. Certamente não somos educadas desde pequenas pra sermos independentes em termos econômicos.

 

2) Mesmo se fosse verdade que toda mulher gasta rios de dinheiro com manicure, cabelos, maquiagem, sapatos, bolsas, depilação, POR QUE DIABOS ISSO ACONTECE? Cês acham mesmo que a gente acorda um dia e decide depilar a virilha assim do nada? Acham mesmo que a gente nasceu amando tirar cutícula? Acham mesmo que desde pequenas sonhamos com peitos de silicone? Ou será, SERÁAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA, que tem um tiquinho de pressão social aí, hmmmmm?

Você que acha que eu estou exagerando, que esse autocuidado é uma coisa típica de mulher, uma coisa natural, uma coisa genética, uma coisa com a qual nascemos: quantas vezes você já criticou o aspecto físico de outra mulher? Quantas vezes você falou ou pensou que feminista não raspa o sovaco? Quantas vezes você não pensou “nossa, que desleixada” quando viu uma mulher com as unhas sem fazer, com as raízes dos cabelos sem pintar, com buço, sem maquiagem, com uma roupa menos arrumada? Bote a mãozinha na consciência e admita pra você mesma que você faz isso todo dia. Eu faço isso todo dia – a diferença é que parei de falar em voz alta, e meu objetivo é parar totalmente de pensar essas coisas. Talvez consiga um dia, mas não garanto; esse condicionamento mental é foda de superar.

Enfim, tudo isso eu queria ter dito, mas não disse porque estava com preguiça de discutir o óbvio.

Hoje em um subgrupo da faculdade (grupo de zap é igual gremlin, se você molhar, ele vira vários outros) alguém postou tuítes do Mr Catra, que não irei reproduzir aqui por preguiça mesmo. Eram vários, um pacote de tuítes, e a maioria tinha conteúdo machista. Bem machista mesmo, escroto, sabe. Eu estava almoçando quando a mensagem chegou; revirei os olhos e voltei ao meu filé de frango na chapa. Qual não foi a minha surpresa quando uma das meninas, anestesista, disse:

“Só achei engraçada a x e a y. As outras são tão machistas que agridem. Desculpa, mas nem consegui achar graça”

Engasguei com a couve de tanta emoção. Logo depois uma das outras meninas, radiologista, deu um reply com o emoji de mulher com a mão levantada, tipo “idem”. Fiz o mesmo. Fui seguida por um dos meninos, proctologista, que disse “também achei. Achei rude e grosseiro”.

MEU

ZEUS

DO

CÉU

Levei a conversa ao grupo das meninas, onde agradeci à anestesista por ter feito a observação, pois estou cansada de ser a única chata do rolé (no Rio é rolé; sorry not sorry). Seguiu-se uma breve mas linda conversa sobre o que é machismo e o que não é, sobre o que é engraçado e o que não é.

A conclusão foi, obviamente, que o humor Trapalhões, que caçoa de mulheres, negros, gordos e gays, tem que ser deixado lá nos anos 80, dos quais jamais deveria ter saído. Uma coisa só é engraçada quando ninguém se ofende. E que o fato de VOCÊ não se ofender com x ou y (eu sou uma que dificilmente me ofendo, por exemplo) não significa que a coisa não é ofensiva pra um outro grupo inteiro de pessoas. Colocar-se no lugar dos outros é um exercício difícil mas que deveríamos fazer sempre. Se alguém tá dizendo que tá sendo ofendido pela piada, pare e pense. É provável que esteja mesmo e que você não tenha pensado sobre isso porque não é o seu calo que está sendo pisado.

NÃO É MIMIMI. NÃO É O MUNDO FICANDO CHATO. É o mundo aprendendo a reclamar quando alguém escroto ri de algo ofensivo pra outras pessoas. Ou seja, é grande a probabilidade que você seja só uma pessoa horrível mesmo que até agora não entendeu que certas piadas são ofensivas e não devem mais ser reproduzidas. 2018, zente. Já deu, né?

Em caso de dúvida, pergunte a alguém que pertence à minoria que está sendo sacaneada. Siga os ensinamentos de Buda: NÃO SEJA CUZÃO.

Um beijo especial pras meninas – Hallynne, Djésmin, Pinho, Sassá – e pro Queiroz. Que mais e mais fichas caiam, todos os dias.

metralhadora de fúria hoje; aguentem.

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Quando minha filha entrou na cozinha hoje pra tomar café, viu minha cara inchada de choro e perguntou se eu tava me sentindo mal. Respondi que sim, porque era um dia muito, muito triste, e expliquei a ela, aos prantos, o que significa perder um museu como o Nacional. Ela me abraçou; tomamos café em silêncio. Ela me perguntou se eu já a tinha levado a esse museu; respondi que não, porque o Rio é uma cidade complicada. Não dá pra simplesmente pensar num lugar e decidir ir – tem a dificuldade de chegar, tem a logística imposta pelo mapa da violência urbana, você precisa se planejar muito, muito bem pra não ser pego no bairro tal em tal hora e não precisar atravessar o túnel tal à noite porque sabe que pode morrer se errar os cálculos. Então nós nunca fomos.

Quando a notícia do incêndio chegou ontem, a Carol tinha acabado de ir pra cama e eu estava sentada na minha poltrona dando a última olhada no Facebook antes de pegar no livro que estou lendo. Alguém postou sobre o incêndio e eu fui procurar no Twitter. Logo depois o Thiago me mandou um áudio totalmente atônito perguntando se eu tinha visto a notícia. Ficamos os dois assim, catatônicos, acompanhando as notícias, até que a raiva chegou e passamos a nos alternar no comando do PistolandoPod, furiosos, vomitando palavrões, consternados e putaços ao mesmo tempo.

Sabemos muito bem que o descaso com a cultura e com a educação não é exclusividade desse governo golpista de merda do caralho. Isso vem desde sempre – a verdade é que o Brasil começou a morrer em 1500, vamos combinar. O que esse vampiro maldito, colocado ali primeiro por um sistema político que impede a governabilidade se não forem feitos pactos com o diabo, e segundo por gente cheia de desonestidade intelectual que sacaneia os petistas pelo sanduíche de mortadela mas foi lá encher o cu de filé mignon pago pela FUCKING FIESP – A FUCKING FIESP, CARALHOOOOOOOOOOOOOOOOOOO – fez com o corte de gastos por 20 anos foi oficializar o horror. Um governo – uma série de governos, um povo inteiro – que caga e anda pra educação e pra cultura merece só um meteoro mesmo. Por sinal, um meteorito foi a única peça que resistiu ao incêndio do museu. Acho significativo.

O brasileiro é todo errado. Nossas prioridades são as piores possíveis, nosso senso de coletivo é inexistente, nosso interesse pelo passado como modo de trabalhar o futuro é nulo, nossa capacidade de nos preocuparmos e nos programarmos a longo prazo é nenhuma. E além de tudo isso ainda temos a ameaça da moral e dos bons costumes. A treta do Queer Museum foi uma das tantas que ilustram claramente o retrocesso mental desse país. A simples existência de uma fucking bancada fucking evangélica, uma aberração em qualquer país minimamente normal, é um sinal claro do atraso que nos toma e que ainda é somente a ponta do iceberg. Quem me conhece sabe: se eu fosse funcionária pública e fosse obrigada a REZAR (‘ORAR’ TEU CU) no trabalho, cara, não haveria coquetel molotov que bastasse no bairro pra apaziguar a minha fúria. Só de pensar que no Rio temos o Crivella como prefeito – UM FUCKING PASTOR DA FUCKING IGREJA UNIVERSAL, PORRAAAAAAAAAAAA, O QUE CARALHOS VOCÊS TÊM NA CABEÇA, SEUS MERDAS, PRA ELEGER UM TRASTE DESSES – eu tenho vontade de chorar. A invasão desses energúmenos filhos da puta na nossa política, seu entranhamento na nossa sociedade, são sinais de que ainda tem MUITO espaço pra piorar. Mas o pior nem é a bancada evangélica propriamente dita, pois são só mais um grupo de pessoas escrotas cuidando dos próprios interesses; o problema maior, a meu ver, é a nossa elite de merda, nossa classe média, a mais escrota que já pisou na face da terra, que prefere apoiar esses merdas a votar “em comunista maconheiro”. Você deixou de votar no Freixo pra votar no Crivella? Você é um merda e não tenho a mínima hesitação em afirmar isso. É um merda, ponto. Agora senta aí e chafurda bem chafurdado na merda que você ajudou a piorar.

Observando isso tudo acontecendo, a gente entende que Darcy Ribeiro tinha mesmo razão e tudo isso que tá acontecendo é um projeto. As mentes da nossa classe média foram moldadas desde sempre pra desprezar o que é nosso e louvar o hemisfério norte; os grandíssimos sacos de merda que diziam que as ciclovias do Haddad em São Paulo eram coisa de comunista pagam pau pra Amsterdã; os mesmos grandíssimos sacos de merda que estão usando esse incêndio como justificativa pra pedir a privatização de tudo são os que ficam babando no Louvre, convenientemente ignorando que os maiores museus do mundo são administrados pelos governos. Trata-se de patrimônio nacional, porra, como é possível uma pessoa ser tão filha da puta a ponto de querer vender seus próprios museus??? Suas próprias indústrias de base, sua infraestrutura? Como é possível alguém defender a venda pra estrangeiros de empresas que são necessárias pra você TER ELETRICIDADE EM CASA, BOTAR GASOLINA NO CARRO, TER ÁGUA ENCANADA?

Eu queria saber por que não queimamos Brasília ainda. Eu sei os motivos, mas queria mesmo entender por que não estamos mais revoltados. Também sei os motivos; somos realmente um povo pouco afeito a guerras, e além disso depois de tantos séculos de ignorância voluntariamente incentivada pela elite dominante, não somos capazes de entender a dimensão da importância de um museu, de uma pesquisa científica, de uma filarmônica, de projetos culturais pras periferias. O importante é que a Lei Rouanet não dê dinheiro à obra Os Macaquinhos. O importante é não ter kit gay nas escolas – e não me dêem espaço pra começar a xingar o Bolsomerda e os merdas que nele votam, porque vocês tão carecas de saber minha opinião a respeito. Foda-se que o museu mais importante da América Latina pegou fogo por falta de verba pra ajeitar a fiação elétrica do prédio (ou por alguma causa dolosa que ainda não conhecemos); o importante é fiscalizar o que cada um faz com seus próprios orifícios corporais. Foda-se que perdemos VINTE FUCKING MILHÕES DE ITENS, décadas de pesquisas, espécimes raríssimos, documentos históricos, espécies ainda não identificadas; o importante é fazer operação militar nas favelas, sabendo muito bem que não serve pra nada além de matar negros e pobres – e aqui incluo os militares mortos durante a intervenção e os PMs que morrem no Rio, e no país inteiro, todos os dias. AIN MAS UMA COISA NÃO EXCLUI A OUTRA – nesse caso, exclui sim, porque a hierarquia das nossas prioridades diz muito sobre o que somos e que valores temos. Os valores da classe média brasileira são, não necessariamente nessa ordem: prefiro eu estar na merda mas ter gente mais na merda do que eu a estar não na merda mas na companhia da classe C no avião; farinha pouca, meu pirão primeiro; a família acima de tudo, mas quero poder jogar minha mulher da janela e depois dizer que não me lembro de nada; privatiza tudo, que se der errado eu vou morar em Miami; bicicleta é coisa de comunista, mas ai como eu amo Amsterdã; socialista é tudo filho da puta, mas aqui tá feia a coisa, vou pra Portugal ajudar a criar um novo nicho mercado de apartamentos com dependência de empregada porque não sei viver sem mucama e meu braço cai se eu tiver que limpar a minha própria privada; tem que matar traficante mesmo, mas a culpa não é minha pois eu votei no Aécio. Pra mim, nada resume e ilustra tão perfeitamente a classe média brasileira quanto os adesivos da Dilma de pernas abertas pra colar no carro. Em tempo: se você já usou esse adesivo e não se arrepende, não entende a magnitude disso, você é um merda também.

Sempre que visito museus fora do Brasil fico pensando que se eu morasse lá teria o passe anual e viveria lá dentro. Fiquei pensando nisso hoje, depois do incêndio. Há algumas semanas uma amiga querida, a Ana Cardoso, me chamou pra darmos uma volta no Museu Oscar Niemeyer aqui em Curitiba. Eu não gosto de arte moderna e abomino a arquitetura dele, mas SEMPRE tem alguma mostra interessante pra ver e eu não vou com a frequência com que deveria. Por preguiça mesmo; a Ana vai sempre, mas ela vai a pé, mora pertinho. Eu moro relativamente perto, mas fico com preguiça de ir mais porque nem todo o acervo deles me interessa. Se houvesse um museu de história natural ou de arte nos moldes da National Gallery de Londres aqui eu certamente moraria lá dentro.

Minha mãe sempre encheu a boca pra falar da Quinta da Boa Vista, porque era realmente uma coisa deslumbrante, pra além da importância histórica da estrutura e do museu. Uma área de lazer invejável numa cidade ridiculamente quente, mas com ridiculamente poucas áreas verdes. Eu fui ao museu várias vezes quando pequena, com meu pai, com excursões da escola. Nunca fui depois de adulta. Me arrependo de não ter levado a Carol. Agora nada daquilo existe mais.

Esse texto tá completamente sem sentido, sem fio condutor, sem lógica entre os parágrafos. Não tenho condições emocionais de escrever nada direito. Ontem fui dormir chorando e xingando, minha cabeça tava uma zona, mil coisas ao mesmo tempo, vários textos misturados. Perdoem a minha confusão mental, por favor.

Eu vou trabalhar na biblioteca hoje à tarde. Quarta-feira o ingresso no Niemeyer é grátis; vou pegar a Carol mais cedo na escola e levá-la ao museu.

Leiam a Eliane Brum sobre o assunto. Nunca houve pessoa que escrevesse tão bem sobre qualquer coisa quanto essa mulher.

Por favor, não seja essa pessoa

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O sempre ótimo André Dahmer descrevendo com precisão o nosso tempo atual.

Meu marido tem um amigo absolutamente odioso. Quando nos conhecemos, ao saber que eu era brasileira ele pediu que eu apresentasse uma amiga piranha a ele; sente o nível. Já bateu na ex-mulher, perde dinheiro no jogo naquelas maquininhas de bar, não quer carteira assinada pra poder pagar menos pensão alimentícia à ex-mulher, dá Coca-Cola pro filho desde que ele tava aprendendo a andar, não usa cinto de segurança. Uma pessoa absolutamente odiosa.

Uma vez comentei com meu sogro como eu acho esse cara péssimo. A resposta dele: mas ele é um “gran lavoratore” – ele trabalha duro, não é preguiçoso.

Na minha cabeça só vem aquele desespero – COMO ASSIMMMMMMMMM – porque um cara que bateu na ex-mulher e encontra meios de pagar menos pensão pode trabalhar duro (trabalha), ser lindo e maravilhoso (não é), cheiroso (não é), dirigir super bem (não), ser super inteligente (marromeno), ser culto (não é), não ter chulé (não sei), não roncar (também não sei), cozinhar bem (cozinha), falar várias línguas (não fala), ajudar velhinha a atravessar a rua (não ajuda) – cara, NADA DISSO (NA-DA-DIS-SO) compensa o fato dele ser uma pessoa merda. Absolutamente nada.

Anos atrás o Berlusconi ganhou eleições depois de prometer ao povo que cortaria o IPTU. Ganhou. Cortou o IPTU. Prefeituras se viram do dia pra noite sem receita pra asfaltar ruas, trocar lâmpadas de postes, consertar sinais de trânsito quebrados, pintar as paredes das escolas.

Hoje um amigo médico postou um vídeo do Bolsomerda falando sobre a Revalida e coisa e tal. Uma querida amiga médica, que admitiu estar mal informada em termos de política, disse que pelo menos isso era uma coisa boa, não?

Então. O negócio é o seguinte: votar num fulano que promete coisas somente pra sua classe ESTÁ ERRADO. A gente tem que votar em quem tem propostas pra TODO MUNDO, caralho. Adianta você estar super bem e todo mundo ao seu redor estar na merda?

MERDA RESPINGA

MERDA RESPINGA

MERDA RESPINGA

Quando todo mundo em volta de você está na merda, essa merda em algum momento vai chegar em você. Não tenha a menor dúvida disso. Pode ser sob forma de um trânsito escroto – você não tá apertado no ônibus passando calor e levando encoxada do grandíssimo saco de merda que sabe que pode abusar porque nada vai lhe acontecer por motivos de: patriarcado do caralho, mas por outro lado tá perdendo horas da sua vida parado no trânsito ouvindo música de qualidade duvidosa – dica: se ouvisse podcast já seria menos pior. Pode ser sob forma de uma epidemia qualquer porque o governo não tem mais dinheiro pra distribuir vacinas – você e seus filhos estão vacinados, mas a Carol também tava vacinada e quase certamente teve sarampo quando era pequena. Forma branda, mas né? Desnecessauro. Pode ser sob forma de pivete que vai te assaltar na esquina porque ele não tá na escola, na escola não tem comida, não tem ventilador, os professores faltam, não tem material, então ele não vai. Pode ser sob forma de não poder ir pro churrasco na casa do amigo do outro lado da cidade porque você não vai passar em frente à favela no seu carrão importado sozinha com seu filho na cadeirinha no banco de trás, né? Não esquece de abaixar o pino da porta e de fechar os vidros, por sinal. Pode ser sob forma de sair do carro e receber na cara aquele fedor de uma cidade imunda, ou de torcer o pé na calçada cujas pedras portuguesas nunca foram consertadas, pode ser de inúmeras maneiras. A merda VAI CHEGAR EM VOCÊ, acredita na tia. Detalhe que todos esses argumentos que eu tô dando partem do pressuposto que você não se incomoda com a merda maior, que é saber que tem gente passando fome, morando na rua, pegando 3 conduções pra ir trabalhar, dormindo na frente da escola pra garantir vaga pro filho. Parto do pressuposto que essas coisas não te incomodam tanto quanto ficar preso no trânsito no ar condicionado do seu carro, porque infelizmente a classe média raciocina assim.

Não seja essa pessoa. Não seja a pessoa que cogita a possibilidade de votar em um cara que, além de ser totalmente despreparado e claramente incompetente, está sendo acusado de apologia ao estupro. E sim, foi apologia ao estupro; para e pensa, caralho. Um cara que saudou um torturador. Bicho, não importa o quanto você odeie a Dilma: se você acha que ela mereceu ser torturada, se você acha que um cara que enfiava canos e por ele enfiava ratos na vagina de mulheres merece qualquer coisa além da boa e velha guilhotina, por favor para de falar comigo, porque você é um merda. Se você acha que um cara que disse – porque tem gravado, não é fake news, não é distorção dos fatos – que fez três filhos homens, na quarta fraquejou e saiu menina (FRAQUEJOU E SAIU MENINA, CARALHOS FLAMEJANTES, CÊS NUM TÊM IDEIA DO ÓDIO QUE EU SINTO DESSE MERDA CADA VEZ QUE EU PENSO NOVAMENTE NESSA FALA DELE) merece seu voto, das duas, uma: ou você é conivente, e portanto um merda, ou você não parou pra pensar direito na coisa. Nem vou apelar pro argumento genérico de que todas as mulheres precisam ser respeitadas; vamos pro pessoal, que é a única coisa que costuma resolver com brasileiro: você gostaria que alguém falasse assim da sua mãe, da sua filha, da sua irmã, da sua esposa? Que ela nasceu porque o pai dela fraquejou? Você concorda que ela tem que ganhar menos do que um homem com iguais qualificações porque um dia ela pode engravidar? Você concorda que se ela for feia não merece ser estuprada (o que, do ponto de vista da lógica, significa que se ela for bonita, merece ser estuprada)? Você acha MESMO que essa pessoa merece o seu voto?

Eu não votaria nessa pessoa desprezível e asquerosa, nesse grandíssimo saco de merda, nem que ele fosse o melhor administrador do mundo – coisa que por sinal ele obviamente não é. É um bosta, um incompetente, um imbecil que mama nas tetas do governo há VINTE E FUCKING SETE ANOS sem aprovar uma caceta de um projeto decente, sem realizar nada, sem fazer absolutamente nada de útil, um grandíssimo saco de merda (doravante abreviado como GSM) que botou os filhos pra mamar nas tetas públicas também e tá metido em uma porção de falcatruas de vários tipos que seus eleitores ruminantes insistem em desmerecer.

Quando você vota numa pessoa desprezível do ponto de vista moral, você é conivente com essa falta de moralidade. Você ajuda a dar legitimidade a uma série de comportamentos absolutamente execráveis, porque afinal de contas se o seu líder faz, por que todos não deveriam se sentir no direito de fazer também? Quando você vota num GSM que acha que armar a população é uma boa ideia, o sangue de todo mundo que vai morrer, além do número já absurdo de homicídios totalmente idiotas que já temos, como gente atirando nos outros no trânsito, na boate, no caralho a quatro, vai estar nas suas mãos. Quando você vota num GSM que escolheu um FUCKING GENERAL como vice, um bosta que diz que índios são indolentes e negros são malandros, você tá contribuindo pra aumentar ainda mais o preconceito, o racismo, o sofrimento das minorias. (Depois não reclame se eles se rebelarem. Não confunda a reação do oprimido com a violência do agressor, tá?)

Não seja essa pessoa. Não vote no GSM 1, o Bozo. Não vote no GSM 2, o ladrão de merenda que vai vender o país a preço de banana, o que vai transformar isso aqui numa verdadeira república das bananas estilo América Central. Um dia vocês vão acordar e achar que estão na Nicarágua. Dica: a Nicarágua não é legal.

Não seja a pessoa que a semanas das eleições não tem a menor ideia do que está acontecendo. Informe-se. O momento é crítico e não podemos nos dar ao luxo de estar com a cabeça nas nuvens e desperdiçar nossos votos. Nunca o futuro do país esteve tão em jogo quanto nessas eleições.

Não seja essa pessoa.

Aborto

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Sempre fui a favor da descriminalização do aborto, por princípio, mas a coisa nunca tinha me tocado de perto. Minha filha foi muito muito muito desejada e planejada, e embora eu franza demais a testa pra mulheres bem informadas que em pleno século XXI ainda confiam na tabelinha como método contraceptivo, a realidade é que NÃO IMPORTA se você usou tabelinha (e portanto digamos que deu um certo mole) ou se a camisinha furou ou a se a pílula era de farinha ou se o DIU saiu do lugar e você engravidou sem querer. Precisamos ter o direito ao aborto e ponto final.

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